PL Mulher

O tradutor intérprete de Libras – português no contexto político

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicou estatísticas sobre surdos no Brasil. Esse estudo, realizado em 2010, relata que aproximandamente 10 milhões de pessoas têm intercorrências relacionadas à surdez, ou seja, 5% da população Brasileira. Destes, 2,7 milhões não ouvem nada.

Assista a tradução do texto em Libras.


Com base em estudos da língua de sinais no campo da Linguística, tivemos o reconhecimento legal da Língua Brasileira de Sinais (Libras) e criação de leis que garantem o acesso à informação por parte dos cidadãos Surdos . É neste contexto que surge a presença do profissional tradutor intérprete de Libras (TILS). A presença destes profissionais em diferentes áreas teve um impulsionamento a partir da publicação do decreto 5.626/2005, que incentiva e regulamenta Cursos de formação técnica e universitária para estes profissionais.


Esse impulsionamento reflete a importante demanda social pela acessibilidade plena na medida em que se observa um interesse cada vez maior de pessoas Surdas por discursos e prática sociais que são produzidos por pessoas ouvintes, especificamente o discurso político partidário, que foi o discurso que gerou mais interlocuções entre brasileiros nos últimos 4 anos, com a popularização da Direita Política e do Movimento Conservador em todo o Brasil a partir de 2018. São recentes os estudos que se debruçam em analisar de perto o trabalho do profissional TILS nesse âmbito que, por sua vez, é requisitado atualmente por força de lei e pelas necessidades impostas a partir das novas configurações de comunicação.

 

Consolidação Política na Comunidade Surda Brasileira


A Comunidade Surda , em uma premissa bastante diferente, e aquela que orienta a nossa visão, é vista como uma minoria linguística que por vezes é minoritarizada (WIRTH, 1945). A Comunidade Surda tem gerado diversas produções e práticas discursivas que buscam entender e explicar os fenômenos sociais que ocorrem dentro da própria comunidade.


Para muitos Surdos, a surdez não é uma deficiência ou uma limitação, mas sim uma maneira única de experimentar e se relacionar com o mundo. Essa visão socioantropológica é baseada no reconhecimento de que os Surdos têm uma língua própria e uma cultura única que merecem ser valorizadas e respeitadas.


A língua de sinais é a forma mais natural de comunicação para os Surdos, pois permite que se comuniquem com fluência e expressividade. Assim, a língua de sinais não é apenas um meio de comunicação, mas uma expressão da cultura Surda. Os Surdos também têm suas próprias tradições, seus valores e suas crenças, que foram moldados pela experiência compartilhada de ‘ser Surdo’ em um mundo ouvinte. Essa vivência, consequentemente, influencia as identidades Surdas, o que é fundamental para a perspectiva socioantropológica dos Estudos Culturais.


No entanto, o Povo Surdo de acordo com Strobel (2009), não partilha das mesmas ideias, uma vez que muitos Surdos provêm de famílias de Surdos, e outros, de famílias ouvintes. E, dentro desse Povo Surdo, há pessoas que são simultaneamente afro-brasileiras, indígenas, homossexuais, conservadoras e surdas com deficiências físicas ou intelectuais.


Até 2018, ano das eleições presidenciais no Brasil, o Povo Surdo não tinha acesso a questões relacionadas a Política Partidária do nosso país. A maioria dos seus membros, só conheciam os candidatos a cargos do Poder Legislativo e Executivo no momento da propaganda política obrigatória veiculada na TV. As propostas e a trajetória de vida dos candidatos ao Poder Legislativo (Municipal, Estadual e Federal) não eram apresentadas de maneira adequada aos eleitores Surdos, devido a própria dinâmica e horário de TV dividido pelos partidos para seus respectivos candidatos. Muitos Surdos votavam em candidatos que a família sugeria ou determinava; votavam sem conhecer a proposta do candidato, ideologia partidária e vida pregressa a candidatura.


Os candidatos ao Poder Executivo, tinham as suas propostas veiculadas na TV por meio das propagandas políticas, utilizando-se de janela de tradução para Libras, as quais, na maioria das vezes, tinham tamanho inadequado ou utilizavam tradutores não tão preparados ou com competências linguística e referencial insuficientes para traduzirem discursos em contexto político.


Nas eleições presidenciais de 2018, com o surgimento de um movimento político antagônico ao espectro de esquerda (e centro-esquerda) que dominou o cenário político nos últimos anos no Brasil, os Surdos passaram a se interessar por assuntos políticos, seguindo a mesma mudança social que os discursos estavam produzindo na sociedade ouvinte brasileira.


Naquele período, alguns líderes Surdos e também tradutores de Libras se posicionaram e apresentaram seus argumentos favoráveis ou contrários ao espectro político oposto, gerando uma polarização na Comunidade Surda brasileira. Isso é visto como algo positivo, visto que, a descentralização e distribuição da informação constitui um fenômeno que contribui para que diferentes vozes sejam ouvidas/vistas, e diferentes pontos de vistas sobre um mesmo assunto possam ser apresentados.


Ao término do processo eleitoral daquele ano, o então candidato a Presidência da República, Jair Messias Bolsonaro, se comprometeu a valorizar a Comunidade Surda Brasileira, apoiando a difusão de Libras e respondendo às suas demandas. Isso provocou uma mudança de paradigma sobre a tradução interpretação na esfera política e promoveu um acesso significativo e consistente de pessoas Surdas ao cenário político brasileiro.


No dia da posse do Presidente da República, a Primeira-Dama do Brasil, Michelle Bolsonaro quebrou o protocolo das cerimônias de posse e discursou antes do presidente, em Língua Brasileira de Sinais – Libras. Uma língua que durante muito tempo estava presente apenas em documentos legais, dessa vez foi apresentada para a sociedade nacional e internacional pelas mãos da Primeira-Dama, trazendo repercussão e visibilidade positivas para a categoria de TILS.


Ainda no Governo Bolsonaro, tivemos a inserção de tradutores intérpretes de Libras em todos os pronunciamentos oficiais e extraoficiais do chefe do Executivo nacional, fato que nunca ocorreu na História do Brasil. Os cidadãos Surdos tiveram, durante 4 anos, acesso a todas as informações oriundas do Poder Executivo, além de inúmeros debates, discussões e participações em eventos políticos que até então eles nunca puderam acessar.


Mantendo o legado do Governo Bolsonaro e dando continuidade aos avanços alcançados em favor dos cidadãos Surdos durante o seu mandato, o Partido Liberal (PL) tem se preocupado em garantir acessibilidade para este grupo minoritário. O partido possui em seu quadro um coordenador de acessibilidade para pessoas Surdas e com deficiência. Todos os eventos do PL Mulher são acessíveis para a Língua Brasileira de Sinais (Libras), o que atrai muitos cidadãos Surdos que se interessam por política, não só como espectadores, mas também como futuros candidatos a cargos públicos. Essa ação de acessibilidade, não atrai somente mulheres, mas também homens Surdos e seus familiares.


Para isso, o profissional TILS se faz necessário nos discursos presenciais e em vídeos institucionais do partido, pois é ele que garantirá, de maneira adequada, em Libras, que as pessoas Surdas tenham acesso às informações disponíveis de uma fonte segura e confiável. Em tempos de desinformação e guerra de narrativas entre os espectros políticos, faz-se necessário que os cidadãos Surdos tenham acesso as informações sem ruídos de comunicação e equívocos discursivos. A iniciativa desenvolvida pelo PL Mulher, presidido por Michelle Bolsonaro, é inédita no mundo, visto que nenhum outro partido político conta com intérpretes contratados nem com uma coordenação de acessibilidade linguística para cidadãos Surdos, isso mostra o compromisso do partido em atender à Comunidade Surda.

 

Conclusão
Os desafios para os TILS ainda permanecem, mesmo tendo conseguido reconhecimento social e avanços trabalhistas com o apoio de parlamentares e simpatizantes da causa Surda, ainda existe um caminho a percorrer e objetivos a alcançar. Já avançamos muito nestes últimos anos, e foi graças à Tradução que a Comunidade Surda hoje tem autonomia para discutir e fazer política de uma maneira nunca imaginada.


É importante dizer que traduzir significa trabalhar com textos e isso implica atividade de leitura e posterior produção da tradução. Geralmente, os TILS trabalham com textos carregados de elementos culturais, frutos de aspectos culturais que nada mais são que efeitos de representações, isto é, efeitos das performances constituídas a partir de aspectos sociais construídos e negociados. (SANTANA, 2019).


Cabe aos profissionais TILS conservadores, pesquisadores da área; lançar um olhar mais atento para essas fronteiras, de modo que possam ser compreendidas e esclarecidas. A política é um assunto que ocupa o cotidiano de todos os brasileiros e o interesse por assuntos políticos é uma realidade também entre os Surdos. Devemos, enquanto TILS, prover o acesso a este tema e aos desdobramentos discursivos que decorrem a partir dele, bem como promover estudos e discussões mais aprofundadas no futuro.

 

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1 Neste artigo optou-se pela grafia ‘Surdo’, com a inicial maiúscula, por entendermos como a maioria dos pesquisadores desse povo, que se trata de um posicionamento político e antropológico do indivíduo que utiliza uma Língua de Sinais, e se posiciona como um ser cultural com identidades e visões de mundo distintas das pessoas que compreende e interage com o mundo por meio de experiências sonoras.

 

2 Entendemos que a Comunidade Surda, diferente do Povo Surdo, de fato não é só de sujeitos Surdos, há também sujeitos não-Surdos – membros de famílias, intérpretes, professores, amigos e outros – que participam e compartilham os mesmos interesses em comum em uma determinada localização. […] Em que lugares? Geralmente em associações de Surdos, federações de Surdos, igrejas e outros (STROBEL, 2008, p. 29).

 

3 De acordo com Wirth (1945), comunidades minoritárias são aquelas que estão sendo tratadas de forma desigual e discriminatória devido às suas diferenças culturais ou físicas, o que leva à discriminação coletiva contra elas. Utilizamos o termo ‘grupos minoritarizados’ para destacar o processo de marginalização e discriminação sofrido por esses grupos, e não apenas sua posição numérica ou social. Esse termo também reconhece a diversidade e a resiliência dessas comunidades, que não são homogêneas ou passivas. Alguns exemplos de comunidades

 

4 De acordo com Strobel (2009), Povo Surdo se refere ao grupo de sujeitos Surdos que têm costumes, histórias, tradições em comum e pertencem às mesmas peculiaridades, ou seja, constroem concepções de mundo através da visão.

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Referências

Brasil. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000.


Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010. Disponível em: https://censo2010.ibge.gov.br/. Acesso em: 19/10/2023.


Santana, N. G. (2021). Tradução intersemiótica de música para libras: Recursos linguísticos e procedimentos técnicos de tradução possíveis. In Textos e Contextos Artísticos e Literários: Tradução e Interpretação em Libras (Volume I) (pp. 54-62).


STROBEL, K. A imagem do outro sobre a cultura surda. In: SKLIAR, C. (Org.). A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação, 2008. p. 91-104.


WIRTH, L. The Problem of Minority Groups. In: LINTON, R. (Ed.). The Science of Man in the World Crisis. New York: Columbia University Press, 1945. p. 347-372.

 

 

 

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